Os laços que nos mantém unidos às pessoas são conhecidos pelo nome de vínculo afetivo ou apego e todos nós temos um estilo próprio de nos relacionarmos com os outros, estilo esse que começa a ser aprendido logo na infância e que serve de modelo para as nossas relações na idade adulta. O vínculo afetivo é de tal forma vital para o desenvolvimento do ser humano que na altura da 2ª Guerra mundial, num orfanato de bebés que tinham perdido os pais, verificou-se que apesar de todos eles terem os mesmos cuidados de saúde, higiene, sono e alimentação, metade deles falecia ou ficava doente, enquanto os outros recuperavam e ficavam saudáveis. Intrigados com esta questão, os médicos acabaram por descobrir que a diferença estava no modo como as enfermeiras cuidavam deles. Ou seja, havia um grupo de enfermeiras que apenas prestava os cuidados básicos, enquanto um outro grupo de enfermeiras, para além de prestarem cuidados básicos, cantavam para os bebés, embalavam-nos, falavam com eles e davam-lhes mimos.

No que toca às relações, a verdade é que o nosso estilo de vínculo relacional afeta praticamente tudo, desde a escolha do nosso namorado(a), à forma como a relação se desenvolve e a maneira como ela acaba. Por exemplo, uma pessoa que seja mais insegura no estabelecimento de vínculos significativos com os outros, sente que para ter as suas necessidades cuidadas, precisa de estar com os outros o tempo todo, caso contrario, sentir-se-á extremamente ansiosa. Para lidar com este desconforto, sofrimento, estas pessoas, inconscientemente, optam por alguém mais retraído, pessoas que gostam de preservar o seu espaço vital. Se por outro lado, for uma pessoa com um estilo evasivo, ela adotara uma postura de maior distanciamento, porque aprendeu que a maneira de ter as suas necessidades satisfeitas, passa por comportar-se como se não tivesse nenhumas. Assim, acaba por se envolver com alguém mais possessivo ou que exija constante atenção. Nós acabamos por procurar pessoas que coincidam com os nossos estilos de funcionamento. Se crescemos num estilo inseguro de vinculação, teremos a tendencia para replicar um estilo semelhante nas nossas relações em adulto, mesmo que esses traços de personalidade nos magoem ou não sejam do nosso interesse. É por isso que é fundamental sabermos qual o nosso estilo ou padrão de vinculação de modo a estarmos mais conscientes sobre as nossas forças e vulnerabilidades nas relações que estabelecemos. De facto, cada um comporta-se de maneira distinta na altura de estabelecer uma relação afetiva. Uns são um pouco desconfiados, evasivos ou ansiosos, enquanto outros não tem qualquer receio em se entregarem nas relações. Uns esperam uma rejeição enquanto outros esperam aceitação, no entanto, o que nos faz ser tão diferentes? O vínculo que desenvolvemos na infância continuará a ser o mesmo em adultos? Será que temos de aprender a amar?

A forma de amar e de nos relacionarmos na idade adulta tem de facto ligações com os padrões de vinculação desenvolvidos desde o nascimento. Assim, tal como na criança, os adultos por norma sentem-se mais seguros quando o parceiro está próximo, está acessível e é afetivamente, responsivo. Muitas pessoas ficam até inspiradas, envolvem-se em mais projetos, sentem-se seguras e mais confiantes com o apoio do namorado(a). Quando alguém se sente estressado, doente ou em perigo, usa o seu parceiro como fonte de segurança, proteção e consolo. Mas há que perceber que há diferenças claras entre a vinculação afetiva em adultos e em crianças. A principal é a de que entre adultos as relações costumam ser simétricas, no sentido em que ambos vão trocando de papéis quando chega a hora de dar e receber apoio (qualquer um dos intervenientes de uma relação pode ser aquele que está estressado ou deprimido e precisa de um pouco mais de apoio), enquanto na relação criança-adulto, é este último que tem o papel de proteger a segurança da criança, seja física ou afetiva. A maneira de amar e expressar o afeto vivido durante a infância pode repetir-se mais tarde. Uma criança que não foi ou não se sentiu amada pelos pais, pode chegar à sua fase adulta e pensar que ninguém a vai querer ou que não é digna do amor dos outros. Esta crença enraizada numa idade muito jovem, permanecerá no modo de estar da pessoa ao longo do tempo e enquanto não acontecer algo que a modifique, poderá ativar-se de forma automática e inconsciente na formação dos laços afetivos, levando a pessoa a atuar da maneira aprendida na infância.

Existem então 4 estilos de vinculação em adultos, o seguro, o evasivo, o ansioso-ambivalente e por fim, o desorganizado:

Vínculo Seguro: As crianças que desenvolveram um vínculo seguro, sentem os pais como uma base segura a partir da qual se podem aventurar e explorar o mundo. Um adulto com este estilo de vínculo possui uma relação semelhante com o parceiro romântico, sentindo-se seguro e ligado, existindo intimidade, confiança e cumplicidade. As suas relações costumam ser honestas, abertas e niveladas, sendo ambos independentes. Por norma gostam de estar nas relações, valorizam-nas, não receiam a proximidade e são os que mais probabilidades têm de se sentirem felizes e confiantes com as suas relações. A rejeição não os preocupa em demasia nem a possibilidade de ficarem sozinhos. Sentem-se cômodos com a dependência que uma relação íntima implica e expressam abertamente as suas preocupações, não tendo por hábito usar estratégias defensivas ou destrutivas para solucionar os problemas mas sim estratégias construtivas de resolução de problemas que impliquem compromisso.

Vínculo Evasivo: por norma estas pessoas receiam a proximidade dos outros e não se sentem cômodos com a intimidade e a dependência saudável inerente. Costumam afirmar que o namorado(a) deseja mais proximidade e intimidade do que aquela que elas podem oferecer. Consideram-se pessoas que não se dão facilmente a conhecer e para elas é muito importante a sua independência e autossuficiência. Quanto maior for o seu nível de estresse ou medo, menos se apoiam no namorado(a), ao contrário do que sucede com os indivíduos seguros. São pessoas que dão pouco, pedem pouco e fogem da intimidade, no entanto isto não quer dizer que muitos deles não desejem essas três coisas. São mecanismos defensivos com o intuito de evitar a rejeição, o medo de sofrer.

Estilo Ansioso-Ambivalente: Quase que se pode descrever este vínculo como um ciclo de “amor-ódio”. As pessoas com este estilo têm por hábito manifestar emoções mais intensas, tanto positivas como negativas. Mais ciumentas, mais apaixonadas e com maior desejo de se fundirem com o namorado(a) e de ter a sua aprovação, sendo mais suscetíveis a oscilações emocionais, alterações de humor. Têm um grande desejo de proximidade e sentem muita ansiedade perante a possibilidade de uma rejeição, preocupando-se frequentemente com a hipótese de que os seus namorados(as) não os desejem e os possam abandonar. Não são pessoas fáceis de se dar a conhecer e costumam ter bastantes dúvidas sobre si próprias, mostrando-se muito inseguras. Sentem mais raiva e hostilidade perante o parceiro especialmente depois de um conflito. Os adultos com este vínculo tendem a sentirem-se confusos sobre o impacto das suas relações afetivas durante a infância. As suas relações atuais com os seus pais estão marcadas por sentimentos de raiva contínua ou por tentarem ser demasiado complacentes, submissos. É como se no fundo ainda tivessem um conflito por resolver com os seus pais.

Vínculo Desorganizado: Por último, embora seja mais raro que os anteriores, as pessoas deste estilo passaram por norma por experiências emocionalmente dolorosas e caóticas na infância, com pais ou cuidadores que nas suas próprias infâncias foram provavelmente severamente maltratados, chegando ao ponto de não terem sequer desenvolvido estratégias defensivas para estar na proximidade dos outros. Por dentro carregam memórias e marcas de vínculos tão aterrorizadoras que são tomadas por uma total impotência e ausência de controlo sobre as situações de vínculo ao longo da vida. Receiam que não há nada que possam fazer para se sentirem seguras, protegidas e amadas, e os seus comportamentos podem alternar entre estados de embutimento afetivo, inibição extrema a explosões violentas de hostilidade para com a pessoa amada.

Estes estilos de vinculação são dinâmicos, podendo haver traços que se fundem e interligam entre eles, resultado da experiencia de vida de cada um, resultando num estilo de vinculação muito próprio. 

Através de diferentes experiências ao longo da nossa vida, os estilos apreendidos na infância, podem mudar. Se uma pessoa que começa uma nova relação com um estilo seguro e o seu parceiro não lhe dá suficiente apoio, não obtendo dele o grau de intimidade que deseja ou chegando mesmo a ser rejeitada, pode vir a tornar-se mais insegura com o passar do tempo. De modo inverso, se uma pessoa estabeleceu um vínculo ansioso durante a infância e envolve-se com alguém que lhe dá segurança e a ensina com o seu comportamento que algumas pessoas ficam presentes quando precisamos delas, mostrando também uma conduta estável, equilibrada, pode estar a ajudá-la a mudar para um estilo de vinculação mais seguro. Na verdade, as nossas ideias preconcebidas e medos podem ser um obstáculo para esta mudança. Uma pessoa que entra numa relação com expectativas de segurança estará mais predisposta a procurar o apoio no seu namorado(a) e a provocar nele a resposta que deseja, enquanto alguém que receia ser rejeitada, pode mostrar-se tão evasiva na relação que acaba por rejeitá-la, confirmando assim as suas expectativas e evitando o desafio de mudar as suas crenças e substitui-las por outras, aprendendo novas formas de amar, novos estilos de vinculação e de comportamentos. Neste sentido, o que acontece é que para algumas pessoas é mais cômodo procurar uma realidade que se ajuste às suas expectativas do que mudar as suas crenças para as ajustar a uma nova realidade, mesmo que esta seja mais agradável. Desta forma é conveniente analisarmos os nosso estilos e formas de estar, como nos relacionamos com os outros, porque o fazemos, e desta forma, se quisermos, poderemos mudar. Isto também nos pode ajudar a compreender a forma de atuar do nosso namorado(a), no entanto, devemos sempre saber onde está o limite e saber quando colocá-lo. Porque o amor só não basta nem tão pouco justifica tudo. A chave está em perceber se a relação permite o crescimento mútuo como casal e como pessoas ao mesmo tempo, em vez de o impedir, bloquear, sempre numa perspetiva de adicionar valor à nossa experiência de vida.

 

Tradução/Adaptação – André Gentil Ruas

Fonte: Waddell, M. – Vida interior, Editor: Assírio e Alvim